quarta-feira, maio 04, 2011

Cola é instituição nacional


Se quiser me tachar de rabugenta, sinta-se à vontade. A verdade é que ninguém conseguirá me persuadir de que a corrupção, este câncer terminal que acomete o nosso encrencado país, não emane da primeira cola.

Como aquele primeiro sutiã, que a gente nunca esquece, a cola acaba se tornando um acessório natural para o jovem mutreteiro. "Faz parte", como diria aquele brutamontes que enganou e mentiu para vencer o show da realidade, mas todo mundo fez que não viu.

Na primeira vez que os futuros políticos, fiscais, jornalistas, juízes, empresários e comerciantes falsificam um resultado na escola, pode crer, a porteira se abre.

Quem cola passa a achar a coisa mais natural do mundo usar de truques e enganação para atingir o sucesso. A cola é tão natural, que acabou se tornando uma instituição nacional, tão enraizada em nosso dia-a-dia quanto a propina e a sonegação de impostos.

"Faz parte" chegar em casa depois de alguma prova e anunciar aos pais que só se conseguiu um bom resultado em razão de se ter colado. "É isso aí, filhão! Garoto esperto!" Também "faz parte" pais e mães aplaudirem a molecada pelo bom resultado escolar, tenha ele sido obtido na base da cola ou do suor da testa. Chegamos ao requinte de ver pais ajudando os filhos na compra de equipamentos eletrônicos, como fones de ouvido para telefone celular, que serão usados exclusivamente para perpetrar a cola.

A prática da cola é tão lícita entre nós tapuias, que um dos maiores jornais do País, O Estado de São Paulo, batizou seu caderno para jovens de "Cola". Que tipo de mensagem O Estadão está tentando dar? Que ser "ishpertinho" e manhoso merece aplauso?

Alo, Homer Simpson! Depois o pessoal ainda chia quando o Brasil é tratado como um país de trapaceiros, até pêlos autores de nosso desenho animado predileto. "Quem não cola não sai da escola". Parece brincadeira, mas estamos acostumados a conviver placidamente com o lamentável ditado, como se fosse mesmo verdade que só se dá bem na escola e na vida quem engana, mente e trapaceia. Será rabugice minha ou este tipo de fundamento escroque não causa a proliferação de tudo aquilo que se opõe à ética e ao talento?

Veja só: estudei a vida inteira na Escola Britânica de São Paulo e nunca colei ou vi alguém colar. A inglesada muito se orgulha do fairplay, o jogo limpo, que eles alegam ter inventado. A cultura deles não incentiva essa mania de vencer a qualquer custo. Nas escolas inglesas, o aluno passa de ano em função da avaliação global do trabalho realizado ao longo do ano, e não baseado na média de notas, como aqui.

Ou seja: lá, eles dispõe de tempo, dinheiro e gente treinada para dar atenção a cada aluno individualmente. Lá, você não é um número que tem a obrigação de produzir apenas boas notas. No fim das contas, é esse "pequeno" detalhe que separa o joio do trigo.

Barbara Gancia

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